terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Ata da Fundação do Fórum de Mulheres



O movimento foi fundado nos corredores do IEC da PUCMG no intervalo das aulas do curso de pós-graduação em processo civil por três advogadas após entusiástico discurso de Calamandrei ecoado lá de 1955, ouvido graças à tecnologia em sala de aula e  por obra e graça de uma das fundadoras, admiradora convicta do mestre florentino. Pois, o discurso na voz emocionada de Piero Calamandrei sobre a indiferença política acendeu nas advogadas a fagulha exatamente quando discursavam no corredor sobre as agruras cotidianas da advocacia.

O que constatamos: as mulheres advogadas estão em desvantagem em relação aos homens advogados. Estamos pressionadas pela questão do tempo, do excesso de trabalho sem contrapartida à altura. Além de perguntar: o que está acontecendo à advocacia, teremos que ir mais fundo e descer a detalhes: o que está acontecendo às mulheres advogadas? 

Obviamente estamos em desvantagem histórica pela nossa condição e nosso papel imposto pela sociedade.

Embalamos o berço, limpamos o bumbum do filhinho, enquanto redigimos uma petição. E nossos colegas, não. Que fazer? Primeiro passo: reunir, somar forças e cabeças pensantes. Criar um movimento, força política, mostrar nossa voz e nossa face. Estão lançadas as bases do movimento. Advogadas interessadas em melhorar o mundo em que vivemos, a nossa profissão e a nossa vida, adiram. Eleita patrona do movimento a jornalista Rosiska Darcy de Oliveira.
O grande dilema da mulher contemporânea é a conquista do tempo e do direito à vida privada. “Vendemos barato o nosso tempo”,  e defende a necessidade de uma readequação da sociedade em prol da felicidade. 
Depois do movimento feminista, cuja afirmação da identidade foi “Nosso corpo nos pertence”, surgiu uma segunda demanda: “Nosso tempo nos pertence”. Trata-se de conquistar seus dias, sua própria vida. Minha geração puxou a entrada maciça das mulheres no mercado de trabalho, mas tivemos que aceitar as condições impostas. Nos anos 70, nós formulamos a estratégia: “Deixe-me entrar no mercado de trabalho que você nem vai perceber que sou mulher”; em casa: “Deixe-me trabalhar que você nem vai perceber que eu saí”. O resultado é uma igualdade capenga. Quebramos um paradigma milenar, mas a sociedade seguiu organizada como se nada tivesse acontecido. É como se dissessem: “Virem-se, vocês não quiseram? Agora, aguentem”.
Não se quebra um paradigma milenar impunemente, mas a conta cobrada das mulheres é indevida, e nós não devemos pagar.O que fazer diante desse cenário?Primeiro, é preciso reconhecer o problema. As mulheres passaram pela fronteira do mundo do trabalho escondendo os assuntos da vida privada. Essa é a parte afetiva – os filhos, os pais, o desejo de ter uma nova formação. A lógica da vida privada não é a mesma do mundo do trabalho. Uma mãe que passa a noite na cabeceira de um filho doente não se rege pela remuneração da enfermeira da noite. A motivação é outra. Não tem preço, mas um dos grandes problemas do nosso mundo é que tudo aquilo que é gratuito se torna invisível. Para as mulheres, fica o sentimento de que nunca estão sendo corretas, nem em casa nem no trabalho. Impera a dupla mensagem: seja, não seja; faça, não faça. É um sofrimento psíquico muito grande no dia a dia, vai muito além da culpa. Essa neurose das mulheres tem de ser transferida à sociedade. A sociedade que é neurótica, não as mulheres. O esgotamento é geral. Qual é a solução? Uma reengenharia do tempo, uma mudança na sociedade. Os empregadores em geral têm de admitir a existência da vida privada, que ela consome energia e tempo. É preciso repensar o que está aí com inteligência social. Não é necessariamente diminuir o tempo do trabalho. É organizá-lo de forma diferente. (Trecho de entrevista à revista Lola, por Luciana Ackermann,  foto de Marcelo Corrêa)
Rosiska Darcy de Oliveira, presidente-executiva do Rio como Vamos,  é carioca, escritora e jornalista. Dirige há 30 anos projetos de fortalecimento da liderança feminina como fator de democratização da sociedade. Doutora em Educação pela Universidade de Genebra, onde lecionou por 10 anos, fundou e é diretora do Instituto de Ação Cultural – IDAC. No governo do Rio de Janeiro, foi assessora especial do professor Darcy Ribeiro para a área de educação. No Governo Federal, presidiu o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e representou o Brasil na Comissão Interamericana de Mulheres da OEA. Chefiou a delegação brasileira à Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim. Integrou o Conselho Assessor sobre Mulher e Desenvolvimento do BID. É membro do Painel Mundial sobre Democracia e do Painel Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável da UNESCO. Autora de vários livros, colabora regularmente com os jornais O Globo e Estado de São Paulo. Preside o Centro de Liderança da Mulher – CELIM. Membro titular do Pen Clube do Brasil, recebeu a Medalha Rio Branco por serviços prestados ao Brasil no exterior, a Medalha Tiradentes da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, os Prêmios RioMania da Associação Comercial do Rio de Janeiro, Orgulho Carioca da Prefeitura do Rio de Janeiro e Personalidade Cidadania 2006 da UNESCO.

Começamos a caminhada. E em boa companhia. 
Caminhemos!